Piedosa fraude
Há casos, que se não fosse anunciado por quem preside, que se trata de "um trecho da Bíblia", nem perceberíamos.
Contam que uma Câmara do interior adotou o sistema de ler a Bíblia na abertura dos trabalhos e antes das votações dos projetos que, naquela casa, aconteciam primeiro. Os trechos eram selecionados pelo responsável da vez pela leitura. Houve um vereador que ficou famoso por sempre acertar uma passagem bíblica que casava direitinho ou com o assunto a ser votado naquele dia, com algum fato importante ocorrido ou com um problema difícil de ser resolvido pelo prefeito embora reclamado exaustivamente pela Câmara. O homem era bom nisso. Tanto, que rápido se tornou o único leitor do livro sagrado, pois nenhum outro se animava competir com o vate que acertava todas, embora isso nem fosse necessário.
Atualmente, tal leitura é generalizada nos legislativos do país – Jacareí não foge à regra – mas, pelo que se sabe ninguém até hoje realizou façanha semelhante àquela. Nem jamais conseguirá porque se descobriu, não demorou muito, que o vereador "iluminado" inventava os versículos que lia para adequá-los às situações reais. Uma piedosa fraude, diga-se, porque buscava enquadrar os colegas a regras eternas, agradava imensamente os frequentadores daquela Câmara Municipal e até eram bem elaborados.
Todavia, a ausência da farsa poderia ser menos radical. Se você tiver um tempinho, assista na internet as aberturas de sessões legislativas – inclusive as locais – e veja como é difícil para nós, mortais, entendermos a passagem lida. Há casos, que se não fosse anunciado por quem preside, que se trata de "um trecho da Bíblia", nem perceberíamos. Bastaria uma simples leitura prévia para o vereador da vez dar o recado de modo claro e proveitoso. Há câmeras filmando tudo; é preciso cada um zelar pela imagem de homem público também de fé. Talvez esse inocente sacrilégio ainda não preocupe; acham que Deus perdoa. Verdade, mas não Lhe agrada a repetição contínua do pecado.
É a nossa opinião.
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