Talvez desde a dúvida se Capitu traiu ou não Bentinho não havia celeuma grande sobre culpa de personagem. Pode ser exagero, mas em 'A Caça' (2012, íntegra no youtube) Lucas é acusado por uma menina de 6 anos de ter cometido abuso sexual. Ele está recém-separado, trabalha como assistente de professores numa escola infantil. A relação com a ex é tensa: ela quer impedir o filho de morar com o pai.

Quando a denúncia de Clara (a garotinha) vem, o 'cancelamento' é imediato. Impedem-no de voltar ao trabalho, proíbem-no de frequentar lojas do vilarejo, e sofre violências física e psicológica. Até o filho Marcus é 'punido'. Ninguém mais confia nele. Todos olham torto. O longa dá dicas da inocência. Porém, há controvérsias. Ao mesmo tempo, o talentoso diretor Thomas Vinterberg mexe com o psicológico do espectador ao soltar pistas de que Lucas cometeu o crime. A magistral interpretação de Maks Mikkelsen ajuda a compreender a posição do acusado.

Ao assistir a primeira vez tive a certeza da inocência. Ao rever, após acompanhar explicações de especialistas forenses e críticos de cinema, decidi pela culpa. Nem sempre encrencas como esta acabam bem. O desfecho de 'A Caça' deixa aberta possibilidades. Se transportarmos ao Brasil, 3 personalidades masculinas foram erroneamente processadas por supostamente serem abusadores – Neymar (Najila, 2019), Marcius Melhem (Dani Calabresa, 2019) e Alexandre Correa (Ana Hickman, 2023).

Observamos que a patrulha 'feminista' da imprensa agiu com rapidez a desmoronar as imagens do trio sem ouvir o outro lado, como manda o bom jornalismo. Na medida em que sentenças saíram (de Alexandre ainda não, mas há provas favoráveis a ele, vide vídeos do youtube de Ricardo Feltrin) não houve a reparação de igual proporção. Johnny Depp e Kevin Spacey tiveram situações semelhantes. Com 'A Caça' refletimos calmamente, por ser um filme. E quando não há este tempo? Uma vida se destrói em segundos. Duração: 115 minutos. Cotação: ótimo.