Ludopatia e o Direito Brasileiro
A dependência em jogos de azar tem repercussões jurídicas relevantes e ainda pouco enfrentadas pelo ordenamento brasileiro.
Ludopatia, também conhecida como transtorno do jogo patológico, é um vício caracterizado pela incapacidade de controlar o impulso de jogar, mesmo quando a pessoa sabe que o jogo está causando problemas financeiros, sociais e emocionais. É uma doença reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
A legalização das apostas esportivas e jogos online no Brasil, consolidada com a Lei nº 14.790/2023, trouxe à tona um problema de saúde pública que desafia o sistema jurídico: a ludopatia, ou transtorno do jogo patológico. Embora tratada predominantemente como uma questão médica, a dependência em jogos de azar tem repercussões jurídicas relevantes e ainda pouco enfrentadas pelo ordenamento brasileiro. A ludopatia é reconhecida pela Classificação Internacional de Doenças (CID-11) como transtorno mental, caracterizado pela incapacidade de controlar o impulso de apostar, mesmo diante de consequências negativas. Com isso, surgem implicações no direito civil, como a discussão sobre a capacidade do ludopata para contratar ou administrar bens, especialmente quando há endividamentos graves ou prejuízos a terceiros.
No direito do consumidor, a questão se volta para a proteção do jogador-paciente. O fornecedor de apostas, ao operar um sistema projetado para maximizar o tempo de jogo e o gasto, pode ser responsabilizado por práticas abusivas, especialmente diante da hipervulnerabilidade do ludopata, conceito já conhecido.
Na esfera penal, os reflexos são delicados. Estudos indicam que quase metade dos jogadores patológicos já cometeram atos ilícitos para sustentar o vício, o que pode levar à discussão sobre imputabilidade penal ou, ao menos, sobre circunstâncias atenuantes nas condutas. Diante desse cenário, o Judiciário começa a enfrentar tais questões com mais frequência, mas ainda sem uniformidade. Falta ao Brasil uma legislação que trate da ludopatia com o devido rigor preventivo e protetivo. Enquanto o mercado de apostas movimenta bilhões de reais, a resposta jurídica segue fragmentada e lenta. Legalizar não basta: é preciso proteger quem perde mais do que dinheiro — perde o controle sobre a própria vida.
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