Walt Kowalski, protagonista de 'Gran Torino' (2008, Prime), pode ser explicado como sendo resumo de todos, ou a maioria, os personagens interpretados por Clint Eastwood, que em maio completou 95 anos. Walt é rabugento, teimoso, ranzinza, mal-educado, irônico, debochado, tem relação conturbada com a igreja e coração mole – característica esta apenas descoberta por quem lhe traz confiança, o que é tarefa árdua. No caso, os irmãos Thao e Sue fazem este papel.

Kowalski, veterano da Guerra da Coreia, funcionário aposentado da Ford, suporta, após ficar viúvo, o desprezo (disfarçado de interesse) dos próprios filhos – querem pôr o pai num asilo. Rosna a cada vez que é incomodado. O padre, inexperiente, lhe aporrinha, deseja sua confissão – último pedido da esposa.

Simultaneamente, Walt se irrita com asiáticos que se mudam à casa vizinha e não falam inglês. Xenofóbico, o 'polaco', como é conhecido pelos amigos, tenta arranjar jeito de seguir sua pacata e sem graça vida de rotinas: acariciar a cadela Daisy, ir ao barbeiro uma vez por mês, tomar cerveja no bar nos fins de semana. Isto com humor negro de Clint, ácido, que nos faz rir com situações que não deveríamos rir.

Tudo muda quando o idoso salva Sue de ser estuprada. A jovem, esperta, carismática, simpatiza com ele. Leva-o a participar das tradições dos hmong, etnia da família, que lhe dá presentes inesperados. Thao, que para entrar na gangue do primo criminoso precisa roubar o carro Gran Torino 1972 do ex-soldado, também é 'cooptado' – 'virará homem'. Para tanto, toma lições com o professor Walt.

O que incomoda ao ranheta são alterações aceleradas do mundo. O bairro, antes tradicional, está apinhado de imigrantes. Há quadrilhas violentas espalhadas pelas redondezas. Um dos filhos – que traidor – trabalha numa revendedora de carros japoneses! Clint dirigiu e roteirizou 'Gran Torino', espécie de testamento artístico – o longa pode ser explicado como sendo um resumo de toda a carreira. Duração: 112 minutos. Cotação: ótimo.