O crime pressupõe gravação ou interceptação lícita e se aplica a fatos ocorridos a partir de 05 de janeiro de 2020.
A República Federativa do Brasil é, no mínimo, um país bastante pitoresco, onde acontecem situações inusitadas, protagonizadas pelas personalidades mais improváveis.
Por exemplo, quem há cinco anos preveria que um parlamentar isolado por seus pares, em razão de suas opiniões polêmicas, se tornaria Presidente e idolatrado por uma multidão de seguidores?
Quem diria que o herói nacional, da noite para o dia, seria tachado de traidor da pátria, pela mesma malta fanática? Mais: passou de magistrado a correligionário do polêmico, e depois candidatíssimo a tomar seu cargo.
Tivemos também a primeira mulher a ser eleita Presidente, que assumiu o cargo de comediante-mor involuntária da nação, mas não teve graça nenhuma e foi desapossada do trono periódico.
Sem contar o condenado, que foi preso para nunca mais se sentar à cabeceira da mesa. O veredicto foi anulado e parece que ele voltará com tudo para ser novamente o que foi proibido de exercer.
Pois no auge do incêndio, fogo mesmo foi a divulgação judicial de áudio obtido com autorização vencida, a revelar diálogo entre nomeante e nomeado, que denotava desvio de finalidade do ato administrativo.
A nomeação foi realizada às pressas mais para refúgio do contemplado na embaixada do país da impunidade, do que para preenchimento de pasta ministerial, o que sepultou definitivamente a hegemonia política proletária.
O reflexo da postura judicial no tabuleiro eleitoral foi tão gigantesco, que a Lei 13.869, de 05 de setembro de 2019, criou um crime de abuso de autoridade inspirado em tal conduta.
A conduta é descrita pelo legislador como 'divulgar gravação ou trecho de gravação sem relação com a prova que se pretenda produzir, expondo a intimidade ou a vida privada ou ferindo a honra ou a imagem do investigado ou acusado.
A pena prevista para o novo delito é de detenção, de um a quatro anos, e multa. O crime pressupõe gravação ou interceptação lícita e se aplica a fatos ocorridos a partir de 05 de janeiro de 2020, obviamente não alcançando a incriminação fatos passados, pois a lei não pode retroagir para prejudicar o réu, prevê a Constituição.